Levar para o aterro ou queimar, é uma interrogação que se coloca somente para os resíduos incineráveis com matéria orgânica total ou parcialmente inclusa.
As enormes quantidades em jogo são devidas aos resíduos urbanos, que atingem milhares de toneladas, mesmo em pequenas cidades.
Quanto ao tratamento destes resíduos há grande polémica, principalmente levantada pelos chamados ambientalistas que pretendem impor o slogan dos 3Rs----Reduzir, Reutilizar, Reciclar.
Muito se tem discutido sobre este dístico sem atingirmos um final consensual, pois todos apresentam razões mais ou menos válidas com valores muito relativos que dificultam o acordo.
Não vamos discutir a validade dos 3Rs, mas vamos comparar as vantagens e inconvenientes inerentes a cada processo, aterro ou queima, para os resíduos urbanos.
Quanto à escolha do local para instalação do aterro é mais difícil de encontrar, dado que tem de obedecer a várias condições físicas do terreno: área, inclinação, proximidade de veios de água, condições geológicas, etc., ao passo que para a central de incineração estes problemas não se colocam com tanta acuidade.
Quanto ao tempo de vida industrial o aterro funciona até estar cheio, o que depende da sua capacidade útil e das quantidades a armazenar diariamente.
Já a central de incineração tem uma duração própria das instalações fabris sujeitas a manutenção periódica e substituição de peças, como é habitual, e daí uma duração funcional muito maior do que um aterro.
Quanto ao comportamento ambiental, os aterros de resíduos orgânicos ou com matéria orgânica produzem:
_ Fortes odores e barulho, atraindo aves e outros animais que se alimentam do próprio lixo.
_ Grande poluição visual e rastos de resíduos que se soltam dos camiões (no transporte e na descarga).
_ Produção de lixiviados que contêm matérias orgânicas perigosas e alta concentração de metais pesados, além do cheiro desagradável. Os lixiviados têm um alto risco de contaminação e infecção.
_ Desperdiça uma valiosa fonte de energia.
_ Deteriora permanentemente o solo utilizado e as vizinhanças.
_ Os aterros constituem um terrível legado para as futuras gerações.
Um aterro depois de cheio é selado, mas a produção de gases e lixiviados continua ainda por muitos anos, com perigos de explosão, incêndios e contaminação dos solos.
Por estas razões os países desenvolvidos definem cada dia mais claramente as suas políticas do destino dos resíduos impondo reduções das áreas existentes de aterros e restrições crescentes a este destino.
Em vários países as políticas governamentais direccionam-se de forma crescente para os tratamentos térmicos, devido à segurança quanto aos riscos ambientais e à elevada redução do volume e peso.
O tratamento dos resíduos por incineração reduz de 90% a necessidade da área de aterro e os consequentes riscos ambientais por este provocados. A redução em peso atinge 75%.
Nos aterros municipais podem ser encontrados, embora com concentrações muito baixas, muitos dos mesmos tipos de resíduos industriais: pesticidas, solventes e produtos químicos variados, são diariamente lançados ao lixo. Neste aspecto os lixiviados de um aterro municipal chegaram a ser considerados como tendo produtos tão nocivos como os de um aterro de resíduos industriais.
Num aterro municipal a decomposição da matéria orgânica, restos de comida principalmente, origina a formação de metano e dióxido de carbono. Note-se que o metano é particularmente agressivo para o ambiente, sendo estimado que a sua contribuição para o efeito de estufa é de cerca de 20 vezes a produzida pelo CO2.
A quantidade de gases emitidos pode ser muito significativa; por exemplo:
Emissões aéreas (neblina-fumos) T/ano:
Aterro não controlado 200
Aterro controlado 45
Centro de tratamento com recuperação
de energia 8
Emissões de CO2 em Kg/ano: aterro 3000
Centro de tratamento com
recuperação de energia 750
No distrito americano de São Louis os regulamentos impõem como obrigatória a recolha de compostos orgânicos voláteis emitidos pelos aterros quando a emissão previsível em função da dimensão do aterro ultrapasse as 15 toneladas por ano (1995).
Nos aterros de resíduos industriais perigosos o metano não será preocupante, mas já o mesmo não se pode afirmar com segurança sobre outros gases. Veja-se que nos aterros municipais, apesar da baixa concentração de produtos químicos voláteis, foi possível detectar concentrações significativas de amónia e sulfuretos e traços de tolueno, diclorometano, etilbenzeno, acetona, acetato de vinilo, benzeno e alguns organoclorados.
A deposição indiscriminada de resíduos em lixeiras ou em aterros mal planificados ou mal geridos dá origem a um negócio que é de baixo custo e bom rendimento, mas que ao longo do tempo pode revelar-se catastrófico para o ambiente e também ruinoso pelos custos de reposição e removimentação dos depósitos.
É importante começar por caracterizar o que entendemos por incineração. Podemos dizer que a incineração é um processo de redução do peso, do volume e das características de perigosidade dos resíduos, com a consequente eliminação da matéria orgânica e características de patogenicidade, através da combustão controlada e redução dos resíduos a cinzas.
Hoje devemos expandir ainda mais este conceito, afirmando que a incineração é também um processo de reciclagem da energia libertada na queima dos materiais, visando a produção de energia eléctrica e vapor, que pode ser imediatamente convertida em frio (cogeração).
A redução do volume é geralmente superior a 90% e em peso superior a 75%.
Para garantia do meio ambiente a combustão tem que ser continuamente controlada, levando-se em conta que o combustível (resíduos urbanos) é desconhecido, isto porque varia ao longo do tempo em composição, humidade, peso específico e poder calorífico. Por isso, os sistemas modernos de incineração de resíduos são dotados de sistemas computorizados de controlo das variáveis da combustão, tanto na câmara primária quanto na de pós-combustão, bem como, nas demais etapas de depuração de gases e produção de energia.
Devido ao uso de equipamentos já absoletos ou ao funcionamento e manutenção inadequados o processo de incineração ganhou o conceito de poluidor, nocivo à saúde e prejudicial ao meio ambiente.
Esta imagem, tão criticada, tem influenciado negativamente nas avaliações e decisões tomadas que envolvem o tratamento e a disposição de resíduos sólidos, líquidos e pastosos, resultando por último em deliberações que excluem a utilização da incineração em qualquer nível ou estágio de avaliação.
Entretanto, sob vários aspectos a incineração constitui o processo mais adequado para a solução ambientalmente segura dos problemas de disposição final de resíduos.
Em países desenvolvidos como Alemanha, Japão, USA e outros, muitas centrais foram construídas recentemente, outras estão em construção, principalmente para a produção de energia. Esta reversão deu-se principalmente nos últimos 10 anos, com o avanço das tecnologias de depuração dos gases e dos controlos por computador de todas as emissões gasosas e líquidas.
Nestes últimos anos a maioria dos sistemas de tratamento de gases das principais instalações naqueles países foram substituídas e hoje atendem integralmente às mais exigentes normas de protecção ambiental. O funcionamento destas tem sido acompanhado de perto pela comunidade local.
É reconhecido hoje por muitos técnicos que quanto mais se recicla mais a incineração se torna a solução apropriada para os resíduos restantes, o que torna o tratamento por incineração um aliado da reciclagem num programa integrado.
Um conceito que tem sido cada vez mais difundido na análise de sistemas de tratamento de resíduos é o de levar para aterro apenas os "resíduos últimos". A noção de resíduo último foi introduzida por Lei de13 de Julho de 1992 em França e tem sido referida como: ""aquele que não é mais passível de tratamento, nas condições técnicas e económicas do momento, principalmente para a extracção da parte valorizável do mesmo, ou até para reduzir o seu carácter poluente ou perigoso.""
Este conceito, como balizante para os resíduos a serem aterrados, tem incrementado a tendência mundial em aumentar a utilização da incineração como um recurso eficaz para ultimar os resíduos e reciclar a energia neles contida.
É importante conhecer o que foi a evolução do processo de incineração no mundo, através das seguintes etapas:
1ª Fase 1950 - 1965
Anteriormente a 1950 as instalações existentes eram demasiadamente incipientes, caracterizando-se como um primeiro estágio de evolução aquelas instaladas de 1950 a 1965. Nesta fase a função única era ainda reduzir o volume do lixo. Os gases eram descarregados directamente para a atmosfera sem qualquer tratamento.
A concentração de poeira atingia níveis de 1000mg/Nm3 (os sistemas modernos alcançam até 3mg/Nm3).
2ª Fase 1965 - 1975
Nesta época aparecem os primeiros sistemas de protecção do meio ambiente, que reduziram as emissões a 100mg/Nm3. Aparecem também os incineradores com câmara dupla, cujo objectivo era melhorar a eficiência da queima.
Surgem os primeiros interessados na recuperação do calor para a produção de energia e as instalações de grande capacidade.
3ª Fase 1975 - 1990
Esta fase é caracterizada no mundo desenvolvido pelo aumento do rendimento energético e desenvolvimento das normas de protecção ambiental. O público começa a estar mais atento aos problemas da poluição. Aparece a introdução dos sistemas complexos de lavagem de gases para reduzir as emissões de gases ácidos, com a neutralização de HCl, SOx, HF e metais pesados. As caldeiras são muito melhores e há uma melhoria nos processos de combustão dos resíduos orgânicos. O automatismo passa a ser centralizado. Multiplicam-se os centros de tratamento com cogeração de energia.
4ª Fase 1990 - actual
Ampliam-se as pressões dos movimentos verdes. O tratamento de gases é sofisticado ainda mais, perseguindo a meta da emissão Zero. Avançam os sistemas para a remoção de outros poluentes como o NOx, dioxinas e furanos. Aparecem as tecnologias avançadas de tratamento para a produção de resíduos finais inertes, que podem ser reciclados ou dispostos sem nenhum problema para o meio ambiente, tal como o uso do plasma térmico.
Vários processos estão-se sofisticando actualmente no pré-tratamento do lixo, anterior à incineração, para aumentar a sua homogeneização, baixar a humidade e melhorar o poder calorífico, de tal forma a transformá-lo num combustível de qualidade para a máxima produção de energia. Sofisticam-se também os processos de combustão com o aumento dos sistemas de turbilhonamento, secagem, ignição e controlo da combustão.
Em vários países podemos encontrar centrais termoeléctricas alimentadas a carvão e lixo em fornos contíguos e com os ciclos de vapor integrados na produção de energia eléctrica.
Desta forma procura-se equacionar ambos os problemas: de energia e do tratamento ambientalmente correcto do lixo, para atender às exigências do meio ambiente.
A tecnologia actualmente disponível de projecto de incineradores pode prever uma produção de até 0,95kWh/t processada, sendo que a grande maioria dos sistemas instalados gera de 0,4 a 0,95 kWh/t. Naturalmente, esta produção dependerá fortemente do poder calorífico dos RSU processados.
A experiência actual indica que a produção de energia eléctrica se torna rentável em instalações de processamento acima de 250t/dia. Abaixo desta capacidade a energia é normalmente aproveitada apenas para uso da própria instalação.
Não seria justo falar do tema da incineração sem ao menos mencionar a co-incineração de resíduos perigosos em fornos de fabricação de clinquer, também denominada usualmente de co-processamento. Este processo, apesar de se enquadrar parcialmente no conceito inicial de incineração, tem um tratamento em separado como um sub-processo dos processos de produção de cimento. Vários técnicos tendem a não considerar o co-processamento como um processo de incineração. Neste processo os resíduos entram em substituição de parte do combustível (economia de energia) ou como parte da matéria-prima.
Para que os resíduos sejam introduzidos nos fornos de clinquer estes têm de sofrer um pré-tratamento específico que garanta que as características do resíduo se mantêm constantes e não vão produzir efeitos nocivos ao cimento produzido ou ao meio ambiente. Há empresas que se dedicam a este tipo de serviço e fazem a ligação entre o gerador de resíduos e a cimenteira.
Tanto devido aos grandes problemas do controlo das emissões dos fornos de cimento, quanto em dependência da manutenção das características técnicas do cimento produzido, surgem sérias limitações em relação aos resíduos aceites para serem co-processados.
Muitos resíduos não são aprovados para serem tratados por este processo, dentre os quais: dioxinas, organoclorados, PCB`s, explosivos, radioactivos, hospitalares, agro-tóxicos, pesticidas, resíduos com altos teores de cloro, enxofre e metais pesados e lixo urbano.
O uso do co-processamento vem crescendo, apesar das restrições impostas para os limites de emissões gasosas que ainda são muito questionáveis, já que neste aspecto os limites impostos à incineração acabam por serem mais rígidos. O que realmente importa para o meio ambiente é a quantidade efectivamente enviada para a atmosfera, medida em quilos hora.
Um processo de incineração não deve existir sem estar interligado com um sistema tecnologicamente avançado de depuração de gases e de tratamento e recirculação dos líquidos do processo.
Os gases efluentes de um incinerador carregam grandes quantidades de substâncias em concentrações muito acima dos limites das emissões legalmente permitidas e necessitam de tratamento físico/químico para remover e neutralizar poluentes provenientes do processamento térmico. Estes sistemas são adequados para cada tipo de resíduo a ser processado, e são baseados num sistema de lavagem ácida de halogéneos, lavagem alcalina e remoção final com lavador de aerossóis ou filtros de mangas.
Na lavagem ácida é feita a retenção inicial do material particulado inerte e a neutralização dos ácidos, com tecnologias específicas para remoção do mercúrio Hg (O), HCl, HF e óxidos, metais pesados, além do controlo das Dioxinas e Furanos. A lavagem alcalina neutraliza os poluentes ácidos e contribui para a retenção de outros poluentes com reacção em ambiente com pH alto. A remoção final de partículas muito finas (menor de 0,7 microns) é feita em Lavador dos Aerossóis ou em filtros de manga.
Os efluentes líquidos são tratados e reciclados, incluindo neutralização de efluentes ácidos, regeneração da soda, sedimentação e dessalinização.
Já existem também filtros catalizadores, desenhados para a retenção de dioxinas e furanos.
A incineração e os demais processos de destruição térmica, incluindo o do plasma térmico, constituem um conjunto de processos com relevância importante na disposição integrada de resíduos sólidos derivado das suas características de redução de peso, volume e da perigosidade dos resíduos, e por consequência a agressão ao meio ambiente, além de permitir a reciclagem final da energia.
Esta importância tem vindo em aumento devido às dificuldades de construção de novos aterros e da necessidade do controlo ambiental do local do aterro por longos períodos, inclusive após estes serem desactivados. Os custos de aterro, que incluem o transporte até ao local e o controlo ambiental, tende a crescer significativamente com o crescimento populacional das grandes cidades.
Os processos de reciclagem não poderão sozinhos resolver o problema dos resíduos urbanos, até porque programas de vulto têm encontrado sérias dificuldades em criar condições de economia no aspecto local e acabam por morrer com o tempo.
Inserido em: 2003-10-25 Última actualização: 2014-04-20
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