Cão de água
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Cão de água

Quando Camões apareceu por aqui, vai fazer catorze anos, com a sua pelagem negra e a exclusiva gravata branca que o tem distinguido de qualquer outro exemplar da espécie canina, todos os humanos da casa se pronunciaram sobre a suposta raça do recém-chegado: um caniche. Fui o único a dizer que caniche não seria, mas cão de água português. (...)

 

Com a passagem do tempo, a questão perdeu interesse: caniche ou cão de água, o companheiro de Pepe e Greta (que já se foram ao paraíso dos cães) era simplesmente o Camões. Os cães vivem pouco para o amor que lhes ganhamos e Camões, final depositário do amor que dedicávamos aos três, já leva catorze anos vividos, como ficou dito acima, e os achaques próprios da idade começam a ameaçá-lo. Nada de grave por enquanto, mas ontem apanhámos um susto: Camões tinha febre, estava murcho, metia-se pelos cantos, de vez em quanto soltava um ganido agudo e, coisa estranha, ele, que tão falto de forças parecia, desceu ao jardim e pôs-se a escavar a terra, fazendo uma cova que a imaginação de Pilar logo percebeu como a mais funesta das previsões. Felizmente, o mau tempo passou, pelo menos por agora. A veterinária não lhe encontrou nada de sério, e Camões, como para nos tranquilizar, recuperou a agilidade, o apetite e a tranquilidade de humor que o caracteriza, e anda por aí feito uma flor com a sua amiga Boli, que passa uns tempos em casa (...).

 

Referência:
http://caderno.josesaramago.org/2009/02/26/cao-de-agua



Copyright Centro Vegetariano. Reprodução permitida desde que indicando o endereço: http://www.centrovegetariano.org/literatura/Article-613-C-o-de--gua.html

Inserido em: 2010-06-19 Última actualização: 2010-06-19

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