Já quase passou um ano desde que deste este testemunho. Não sei se verás isto, nem sei se ainda frequentas a FEUNL, mas se sim então somos colegas (estou a fazer licenciatura em Economia) e de qualquer forma talvez outra pessoa que leia me possa responder.
Com o background de estudos que tens e de um ponto de vista estritamente económico (e sem querer ofender ninguém!), parece ser um 'erro' adoptar a dieta vegetariana - os custos para o consumidor aumentam, a relação custo-benefício nem se compara, ... Repara, os produtos básicos tornam-se mais caros e as poupanças em carne e peixe não compensam os custos acrescidos em produtos mais processados, como o tofu, o seitan, o tempeh, ou a soja.
Posto isto, como explicar a tua decisão racionalmente e com argumentos económicos? Ou não se explica? É o sacríficio por uma consciência mais limpa (uma carteira mais leve)?
Pergunto isto porque motivos morais, éticos, ambientais, etc não faltam. Mas se me colocam esta questão (no fundo a dos custos alimentares do vegetarianismo), não sei que responda.
Se tu ou alguém puder responder, agradeço muito desde já!
Maria
(Por: Maria)
só agora calhei de ver tua mensagem. Vou te dar então meu ponto de vista estritamente económico:-)
A minha opinião pessoal é que de facto a alimentação vegetariana torna-se mais cara porque existe a tendência de consumir produtos de melhor qualidade nutritiva como por exemplo alimentos integrais ou produtos que não estão sujeitos a grande procura pelo que o custo médio de produção destes produtos é elevado. No entanto, posso revelar-te que estive nestes últimos meses a viver na República Checa e agora vivo na Suíça e em ambos não encontras a diversidade de oferta de produtos mais orientados para os vegetarianos/veganos que já existe nas grandes superfícies comerciais em Portugal. Pelo que nesse aspecto Portugal está a evoluir bastante bem.
Também não é justo comparares o preço de mercado da carne com os produtos processados como o tofu ou outros. O que se passa é que existem imensas externalidades negativas que não estão reflectidas no consumo da carne, como seja o metano lançado para a atmosfera, a poluição dos rios e aquíferos, o consumo de água (água essa que é paga a um valor muito inferior ao seu valor intrinseco), gastos com medicamentos e tratamentos de doenças relacionadas com consumo de carne (ex: cancro do cólon) etc,etc. O preço relativo dos bens está desta forma imensamente distorcido. Se fosses a aplicar um imposto de Pigout no valor das externalidades negativas do consumo de carne, o seu preço seria provavelmente tão elevado que a maioria das pessoas não poderia consumir carne.
Em parte a redução do IVA nos produtos vegetarianos ajudou a colmatar uma parte da distorção, mas é uma gota num oceano.
Se pretenderes tornar-te vegetariana, o argumento económico será na minha modesta opinião, o argumento mais controverso que poderás usar. Em jeito de conclusão a alimentação vegetariana se é mais cara, é sobretudo porque o preço da carne está imensamente distorcido, não reflectindo o impacto negativo na sociedade.
Mas quando um bilião de pessoas estão subnutridas (e que por esse motivo e outros nunca terão as mesmas oportunidades que nós) e usamos 40% dos cereais se não estou em erro para alimentar os animais que apenas servem aos nossos caprichos alimentares/tradição, destrói-se a Amazónia para plantar soja para alimentar estes mesmos animais que sofrem dor e têm sentimentos e que são tratados sem o mínimo de respeito, não tens que te preocupar com argumento económico a menos que tenhas mesmo dificuldades económicas...
Vivemos num mundo muito injusto e egoísta, e tudo o que aprendes em economia parte do pressuposto que a tua utilidade (uma medida muito pouco concreta de "felicidade") não depende da utilidade dos outros.
Apenas mais uma curiosidade : se frequentares economia pública com o Prof Corte Real, há-de haver um exercício em que se mostra que se a tua utilidade não depende da utilidade dos outros é exactamente igual à utilidade depender dos outros de forma negativa, isto é, quanto maior é a utilidade dos outros, menor é a tua. Ou seja, a indiferença é igual ao ódio..
Tudo de bom,
Pedro
> Olá Pedro
>
> Já quase passou um ano desde que deste este testemunho. Não sei se verás
> isto, nem sei se ainda frequentas a FEUNL, mas se sim então somos colegas
> (estou a fazer licenciatura em Economia) e de qualquer forma talvez outra
> pessoa que leia me possa responder.
> Com o background de estudos que tens e de um ponto de vista estritamente
> económico (e sem querer ofender ninguém!), parece ser um 'erro' adoptar a
> dieta vegetariana - os custos para o consumidor aumentam, a relação
> custo-benefício nem se compara, ... Repara, os produtos básicos tornam-se
> mais caros e as poupanças em carne e peixe não compensam os custos
> acrescidos em produtos mais processados, como o tofu, o seitan, o tempeh,
> ou a soja.
>
> Posto isto, como explicar a tua decisão racionalmente e com argumentos
> económicos? Ou não se explica? É o sacríficio por uma consciência mais
> limpa (uma carteira mais leve)?
>
> Pergunto isto porque motivos morais, éticos, ambientais, etc não faltam.
> Mas se me colocam esta questão (no fundo a dos custos alimentares do
> vegetarianismo), não sei que responda.
>
> Se tu ou alguém puder responder, agradeço muito desde já!
> Maria
> (Por: Maria)
Essa resposta que Pedro escreveu a Maria é genial por si só, e até mais interessante do que o texto original postado na página. Deveria ser publicado como um texto à parte. É muito interessante mesmo. Parabéns, Pedro.
pedrito escreveu:
>
>
> Olá Maria,
>
>
> só agora calhei de ver tua mensagem. Vou te dar então meu ponto de vista
> estritamente económico:-)
>
> A minha opinião pessoal é que de facto a alimentação vegetariana torna-se
> mais cara porque existe a tendência de consumir produtos de melhor
> qualidade nutritiva como por exemplo alimentos integrais ou produtos que
> não estão sujeitos a grande procura pelo que o custo médio de produção
> destes produtos é elevado. No entanto, posso revelar-te que estive nestes
> últimos meses a viver na República Checa e agora vivo na Suíça e em ambos
> não encontras a diversidade de oferta de produtos mais orientados para os
> vegetarianos/veganos que já existe nas grandes superfícies comerciais em
> Portugal. Pelo que nesse aspecto Portugal está a evoluir bastante bem.
>
> Também não é justo comparares o preço de mercado da carne com os produtos
> processados como o tofu ou outros. O que se passa é que existem imensas
> externalidades negativas que não estão reflectidas no consumo da carne,
> como seja o metano lançado para a atmosfera, a poluição dos rios e
> aquíferos, o consumo de água (água essa que é paga a um valor muito
> inferior ao seu valor intrinseco), gastos com medicamentos e tratamentos de
> doenças relacionadas com consumo de carne (ex: cancro do cólon) etc,etc. O
> preço relativo dos bens está desta forma imensamente distorcido. Se fosses
> a aplicar um imposto de Pigout no valor das externalidades negativas do
> consumo de carne, o seu preço seria provavelmente tão elevado que a maioria
> das pessoas não poderia consumir carne.
>
> Em parte a redução do IVA nos produtos vegetarianos ajudou a colmatar uma
> parte da distorção, mas é uma gota num oceano.
>
> Se pretenderes tornar-te vegetariana, o argumento económico será na minha
> modesta opinião, o argumento mais controverso que poderás usar. Em jeito de
> conclusão a alimentação vegetariana se é mais cara, é sobretudo porque o
> preço da carne está imensamente distorcido, não reflectindo o impacto
> negativo na sociedade.
>
> Mas quando um bilião de pessoas estão subnutridas (e que por esse motivo e
> outros nunca terão as mesmas oportunidades que nós) e usamos 40% dos
> cereais se não estou em erro para alimentar os animais que apenas servem
> aos nossos caprichos alimentares/tradição, destrói-se a Amazónia para
> plantar soja para alimentar estes mesmos animais que sofrem dor e têm
> sentimentos e que são tratados sem o mínimo de respeito, não tens que te
> preocupar com argumento económico a menos que tenhas mesmo dificuldades
> económicas...
>
> Vivemos num mundo muito injusto e egoísta, e tudo o que aprendes em
> economia parte do pressuposto que a tua utilidade (uma medida muito pouco
> concreta de "felicidade") não depende da utilidade dos outros.
>
> Apenas mais uma curiosidade : se frequentares economia pública com o Prof
> Corte Real, há-de haver um exercício em que se mostra que se a tua
> utilidade não depende da utilidade dos outros é exactamente igual à
> utilidade depender dos outros de forma negativa, isto é, quanto maior é a
> utilidade dos outros, menor é a tua. Ou seja, a indiferença é igual ao
> ódio..
>
> Tudo de bom,
>
> Pedro
>
>
>
>
>
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>
> > Olá Pedro
> >
> > Já quase passou um ano desde que deste este testemunho. Não sei se
> verás
> > isto, nem sei se ainda frequentas a FEUNL, mas se sim então somos
> colegas
> > (estou a fazer licenciatura em Economia) e de qualquer forma talvez
> outra
> > pessoa que leia me possa responder.
> > Com o background de estudos que tens e de um ponto de vista
> estritamente
> > económico (e sem querer ofender ninguém!), parece ser um 'erro' adoptar
> a
> > dieta vegetariana - os custos para o consumidor aumentam, a relação
> > custo-benefício nem se compara, ... Repara, os produtos básicos
> tornam-se
> > mais caros e as poupanças em carne e peixe não compensam os custos
> > acrescidos em produtos mais processados, como o tofu, o seitan, o
> tempeh,
> > ou a soja.
> >
> > Posto isto, como explicar a tua decisão racionalmente e com argumentos
> > económicos? Ou não se explica? É o sacríficio por uma consciência mais
> > limpa (uma carteira mais leve)?
> >
> > Pergunto isto porque motivos morais, éticos, ambientais, etc não
> faltam.
> > Mas se me colocam esta questão (no fundo a dos custos alimentares do
> > vegetarianismo), não sei que responda.
> >
> > Se tu ou alguém puder responder, agradeço muito desde já!
> > Maria
> > (Por: Maria)
>
Vi apenas agora a tua pergunta relativamente à questão económica da dieta vegetariana. Deixa-me primeiro que tudo separar duas questões economicamente falando: Prisma individual ou egoísta e o Prisma
a escala global.
O prisma à escala global o Pedro de uma forma simplista já te respondeu e visto duma perspectiva europeia apenas. Se alargarmos o conceito ao veganismo, então nota-se (talvez) ainda mais a complexidade económica subjacente, vide o "dumping" dos lacticínios no terceiro mundo, que novamente volta para a questão hipócrita da pseudo lei económica da escassez vs oferta e procura que é imensamente regulada para proteger os lobbies, esses sim "económicos". O valor intrinseco para a qualidade de vida, complementando com o valor da mão-de-obra directa e indirecta necessária para repor os contra-efeitos do consumo da carne a nível mundial é imensamente mais elevado do que qq consumo vegetariano ou vegano, seja de que perpectiva for e fazendo as contas como quiseres, parece-me óbvio seja duma perspectiva simplista ou complexa, vejamos apenas o quanto consome um quilo de animal em água, cereais, terreno, metano, etc.
A questão individual essa já requer uma mudança de mentalidade quanto aos valores dos alimentos. Eu cresci a pensar que a carne é que puxa carroça, e hoje ainda apanho pessoas que quando digo que sou vegetariano ou vegano não fazem ideia do que eu como ou nao como. E todos os não instruídos na matérias, mesmo alguns que o são, pensam que tenho deficiências alimentares e dizem: ah tu és daqueles que comem aqueles tofus e os satans e essas coisas né? Ora eu raramente (excepto quando estou em casa dos meus pais) como alimentos processados e caramba como eu gasto pouquíssimo dinheiro em comida, no entanto recebo tambem muitos comentários de pessoas de que nao sao vegetarianas porque é muito caro. O leite é mais barato do que as bebidas de soja, arroz, aveia, etc apenas no supermercado e isso é porque os meus impostos servem para comparticipar a sua produção, senão não era. A bebida de amendoa e de aveia que eu faço em casa fica-me muito mais barata. Enquanto os meus amigos comem bifanas eu como beringela, e para mim fica mais barato. Arroz com feijão é uma excelente refeição e muito mais barata. Mas também aqui a questão do valor intrínseco se põe, pois são os meus impostos que andam a pagar os tratamentos dos cancros e outras enfermidades que derivaram de uma má nutrição. Mesmo com os preços assim como são com todos estes lobbies seja à escala global ou à escala individual, à falta de dinheiro a escolha lógica duma perpectiva puramente financeira é a dieta vegana.
(Por: Vitor Hugo)
em Abril vai haver um webinário que provavelmente te vai interessar: https://earthscanevents.webex.com/mw0306lc/mywebex/default.do?nomenu=true&siteurl=earthscanevents&service=6&main_url=https%3A%2F%2Fearthscanevents.webex.com%2Fec0605lc%2Feventcenter%2Fevent%2FeventAction.do%3FtheAction%3Ddetail%26confViewID%3D646136505%26siteurl%3Dearthscanevents%26%26%26
> Maria,
>
> Vi apenas agora a tua pergunta relativamente à questão económica da dieta
> vegetariana. Deixa-me primeiro que tudo separar duas questões
> economicamente falando: Prisma individual ou egoísta e o Prisma
> a escala global.
> O prisma à escala global o Pedro de uma forma simplista já te respondeu e
> visto duma perspectiva europeia apenas. Se alargarmos o conceito ao
> veganismo, então nota-se (talvez) ainda mais a complexidade económica
> subjacente, vide o "dumping" dos lacticínios no terceiro mundo, que
> novamente volta para a questão hipócrita da pseudo lei económica da
> escassez vs oferta e procura que é imensamente regulada para proteger os
> lobbies, esses sim "económicos". O valor intrinseco para a qualidade de
> vida, complementando com o valor da mão-de-obra directa e indirecta
> necessária para repor os contra-efeitos do consumo da carne a nível mundial
> é imensamente mais elevado do que qq consumo vegetariano ou vegano, seja de
> que perpectiva for e fazendo as contas como quiseres, parece-me óbvio seja
> duma perspectiva simplista ou complexa, vejamos apenas o quanto consome um
> quilo de animal em água, cereais, terreno, metano, etc.
> A questão individual essa já requer uma mudança de mentalidade quanto aos
> valores dos alimentos. Eu cresci a pensar que a carne é que puxa carroça, e
> hoje ainda apanho pessoas que quando digo que sou vegetariano ou vegano não
> fazem ideia do que eu como ou nao como. E todos os não instruídos na
> matérias, mesmo alguns que o são, pensam que tenho deficiências alimentares
> e dizem: ah tu és daqueles que comem aqueles tofus e os satans e essas
> coisas né? Ora eu raramente (excepto quando estou em casa dos meus pais)
> como alimentos processados e caramba como eu gasto pouquíssimo dinheiro em
> comida, no entanto recebo tambem muitos comentários de pessoas de que nao
> sao vegetarianas porque é muito caro. O leite é mais barato do que as
> bebidas de soja, arroz, aveia, etc apenas no supermercado e isso é porque
> os meus impostos servem para comparticipar a sua produção, senão não era. A
> bebida de amendoa e de aveia que eu faço em casa fica-me muito mais barata.
> Enquanto os meus amigos comem bifanas eu como beringela, e para mim fica
> mais barato. Arroz com feijão é uma excelente refeição e muito mais barata.
> Mas também aqui a questão do valor intrínseco se põe, pois são os meus
> impostos que andam a pagar os tratamentos dos cancros e outras enfermidades
> que derivaram de uma má nutrição. Mesmo com os preços assim como são com
> todos estes lobbies seja à escala global ou à escala individual, à falta de
> dinheiro a escolha lógica duma perpectiva puramente financeira é a dieta
> vegana.
> (Por: Vitor Hugo)
economicamente falando...
Olá Pedro
[Por: @ 2009-01-28, 00:16 | Responder | Imprimir ]Já quase passou um ano desde que deste este testemunho. Não sei se verás isto, nem sei se ainda frequentas a FEUNL, mas se sim então somos colegas (estou a fazer licenciatura em Economia) e de qualquer forma talvez outra pessoa que leia me possa responder.
Com o background de estudos que tens e de um ponto de vista estritamente económico (e sem querer ofender ninguém!), parece ser um 'erro' adoptar a dieta vegetariana - os custos para o consumidor aumentam, a relação custo-benefício nem se compara, ... Repara, os produtos básicos tornam-se mais caros e as poupanças em carne e peixe não compensam os custos acrescidos em produtos mais processados, como o tofu, o seitan, o tempeh, ou a soja.
Posto isto, como explicar a tua decisão racionalmente e com argumentos económicos? Ou não se explica? É o sacríficio por uma consciência mais limpa (uma carteira mais leve)?
Pergunto isto porque motivos morais, éticos, ambientais, etc não faltam. Mas se me colocam esta questão (no fundo a dos custos alimentares do vegetarianismo), não sei que responda.
Se tu ou alguém puder responder, agradeço muito desde já!
Maria
(Por: Maria)
Re: economicamente falando...
A alimentação vegetariana pode de facto ser mais económica. Sugiro que leias http://www.centrovegetariano.org/index.php?article_id=385
[Por: @ 2009-02-08, 10:55 | Responder | Imprimir ](Por: cristina)
Re: economicamente falando...
[Por: pedrito @ 2009-10-29, 23:55 | Responder | Imprimir ]Olá Maria,
só agora calhei de ver tua mensagem. Vou te dar então meu ponto de vista estritamente económico:-)
A minha opinião pessoal é que de facto a alimentação vegetariana torna-se mais cara porque existe a tendência de consumir produtos de melhor qualidade nutritiva como por exemplo alimentos integrais ou produtos que não estão sujeitos a grande procura pelo que o custo médio de produção destes produtos é elevado. No entanto, posso revelar-te que estive nestes últimos meses a viver na República Checa e agora vivo na Suíça e em ambos não encontras a diversidade de oferta de produtos mais orientados para os vegetarianos/veganos que já existe nas grandes superfícies comerciais em Portugal. Pelo que nesse aspecto Portugal está a evoluir bastante bem.
Também não é justo comparares o preço de mercado da carne com os produtos processados como o tofu ou outros. O que se passa é que existem imensas externalidades negativas que não estão reflectidas no consumo da carne, como seja o metano lançado para a atmosfera, a poluição dos rios e aquíferos, o consumo de água (água essa que é paga a um valor muito inferior ao seu valor intrinseco), gastos com medicamentos e tratamentos de doenças relacionadas com consumo de carne (ex: cancro do cólon) etc,etc. O preço relativo dos bens está desta forma imensamente distorcido. Se fosses a aplicar um imposto de Pigout no valor das externalidades negativas do consumo de carne, o seu preço seria provavelmente tão elevado que a maioria das pessoas não poderia consumir carne.
Em parte a redução do IVA nos produtos vegetarianos ajudou a colmatar uma parte da distorção, mas é uma gota num oceano.
Se pretenderes tornar-te vegetariana, o argumento económico será na minha modesta opinião, o argumento mais controverso que poderás usar. Em jeito de conclusão a alimentação vegetariana se é mais cara, é sobretudo porque o preço da carne está imensamente distorcido, não reflectindo o impacto negativo na sociedade.
Mas quando um bilião de pessoas estão subnutridas (e que por esse motivo e outros nunca terão as mesmas oportunidades que nós) e usamos 40% dos cereais se não estou em erro para alimentar os animais que apenas servem aos nossos caprichos alimentares/tradição, destrói-se a Amazónia para plantar soja para alimentar estes mesmos animais que sofrem dor e têm sentimentos e que são tratados sem o mínimo de respeito, não tens que te preocupar com argumento económico a menos que tenhas mesmo dificuldades económicas...
Vivemos num mundo muito injusto e egoísta, e tudo o que aprendes em economia parte do pressuposto que a tua utilidade (uma medida muito pouco concreta de "felicidade") não depende da utilidade dos outros.
Apenas mais uma curiosidade : se frequentares economia pública com o Prof Corte Real, há-de haver um exercício em que se mostra que se a tua utilidade não depende da utilidade dos outros é exactamente igual à utilidade depender dos outros de forma negativa, isto é, quanto maior é a utilidade dos outros, menor é a tua. Ou seja, a indiferença é igual ao ódio..
Tudo de bom,
Pedro
> Olá Pedro
>
> Já quase passou um ano desde que deste este testemunho. Não sei se verás
> isto, nem sei se ainda frequentas a FEUNL, mas se sim então somos colegas
> (estou a fazer licenciatura em Economia) e de qualquer forma talvez outra
> pessoa que leia me possa responder.
> Com o background de estudos que tens e de um ponto de vista estritamente
> económico (e sem querer ofender ninguém!), parece ser um 'erro' adoptar a
> dieta vegetariana - os custos para o consumidor aumentam, a relação
> custo-benefício nem se compara, ... Repara, os produtos básicos tornam-se
> mais caros e as poupanças em carne e peixe não compensam os custos
> acrescidos em produtos mais processados, como o tofu, o seitan, o tempeh,
> ou a soja.
>
> Posto isto, como explicar a tua decisão racionalmente e com argumentos
> económicos? Ou não se explica? É o sacríficio por uma consciência mais
> limpa (uma carteira mais leve)?
>
> Pergunto isto porque motivos morais, éticos, ambientais, etc não faltam.
> Mas se me colocam esta questão (no fundo a dos custos alimentares do
> vegetarianismo), não sei que responda.
>
> Se tu ou alguém puder responder, agradeço muito desde já!
> Maria
> (Por: Maria)
Re: economicamente falando...
Essa resposta que Pedro escreveu a Maria é genial por si só, e até mais interessante do que o texto original postado na página. Deveria ser publicado como um texto à parte. É muito interessante mesmo. Parabéns, Pedro.
[Por: @ 2011-02-23, 13:19 | Responder | Imprimir ]pedrito escreveu:
>
>
> Olá Maria,
>
>
> só agora calhei de ver tua mensagem. Vou te dar então meu ponto de vista
> estritamente económico:-)
>
> A minha opinião pessoal é que de facto a alimentação vegetariana torna-se
> mais cara porque existe a tendência de consumir produtos de melhor
> qualidade nutritiva como por exemplo alimentos integrais ou produtos que
> não estão sujeitos a grande procura pelo que o custo médio de produção
> destes produtos é elevado. No entanto, posso revelar-te que estive nestes
> últimos meses a viver na República Checa e agora vivo na Suíça e em ambos
> não encontras a diversidade de oferta de produtos mais orientados para os
> vegetarianos/veganos que já existe nas grandes superfícies comerciais em
> Portugal. Pelo que nesse aspecto Portugal está a evoluir bastante bem.
>
> Também não é justo comparares o preço de mercado da carne com os produtos
> processados como o tofu ou outros. O que se passa é que existem imensas
> externalidades negativas que não estão reflectidas no consumo da carne,
> como seja o metano lançado para a atmosfera, a poluição dos rios e
> aquíferos, o consumo de água (água essa que é paga a um valor muito
> inferior ao seu valor intrinseco), gastos com medicamentos e tratamentos de
> doenças relacionadas com consumo de carne (ex: cancro do cólon) etc,etc. O
> preço relativo dos bens está desta forma imensamente distorcido. Se fosses
> a aplicar um imposto de Pigout no valor das externalidades negativas do
> consumo de carne, o seu preço seria provavelmente tão elevado que a maioria
> das pessoas não poderia consumir carne.
>
> Em parte a redução do IVA nos produtos vegetarianos ajudou a colmatar uma
> parte da distorção, mas é uma gota num oceano.
>
> Se pretenderes tornar-te vegetariana, o argumento económico será na minha
> modesta opinião, o argumento mais controverso que poderás usar. Em jeito de
> conclusão a alimentação vegetariana se é mais cara, é sobretudo porque o
> preço da carne está imensamente distorcido, não reflectindo o impacto
> negativo na sociedade.
>
> Mas quando um bilião de pessoas estão subnutridas (e que por esse motivo e
> outros nunca terão as mesmas oportunidades que nós) e usamos 40% dos
> cereais se não estou em erro para alimentar os animais que apenas servem
> aos nossos caprichos alimentares/tradição, destrói-se a Amazónia para
> plantar soja para alimentar estes mesmos animais que sofrem dor e têm
> sentimentos e que são tratados sem o mínimo de respeito, não tens que te
> preocupar com argumento económico a menos que tenhas mesmo dificuldades
> económicas...
>
> Vivemos num mundo muito injusto e egoísta, e tudo o que aprendes em
> economia parte do pressuposto que a tua utilidade (uma medida muito pouco
> concreta de "felicidade") não depende da utilidade dos outros.
>
> Apenas mais uma curiosidade : se frequentares economia pública com o Prof
> Corte Real, há-de haver um exercício em que se mostra que se a tua
> utilidade não depende da utilidade dos outros é exactamente igual à
> utilidade depender dos outros de forma negativa, isto é, quanto maior é a
> utilidade dos outros, menor é a tua. Ou seja, a indiferença é igual ao
> ódio..
>
> Tudo de bom,
>
> Pedro
>
>
>
>
>
>
>
> > Olá Pedro
> >
> > Já quase passou um ano desde que deste este testemunho. Não sei se
> verás
> > isto, nem sei se ainda frequentas a FEUNL, mas se sim então somos
> colegas
> > (estou a fazer licenciatura em Economia) e de qualquer forma talvez
> outra
> > pessoa que leia me possa responder.
> > Com o background de estudos que tens e de um ponto de vista
> estritamente
> > económico (e sem querer ofender ninguém!), parece ser um 'erro' adoptar
> a
> > dieta vegetariana - os custos para o consumidor aumentam, a relação
> > custo-benefício nem se compara, ... Repara, os produtos básicos
> tornam-se
> > mais caros e as poupanças em carne e peixe não compensam os custos
> > acrescidos em produtos mais processados, como o tofu, o seitan, o
> tempeh,
> > ou a soja.
> >
> > Posto isto, como explicar a tua decisão racionalmente e com argumentos
> > económicos? Ou não se explica? É o sacríficio por uma consciência mais
> > limpa (uma carteira mais leve)?
> >
> > Pergunto isto porque motivos morais, éticos, ambientais, etc não
> faltam.
> > Mas se me colocam esta questão (no fundo a dos custos alimentares do
> > vegetarianismo), não sei que responda.
> >
> > Se tu ou alguém puder responder, agradeço muito desde já!
> > Maria
> > (Por: Maria)
>
(Por: fabricio)
Re: economicamente falando...
Maria,
[Por: @ 2011-02-24, 03:26 | Responder | Imprimir ]Vi apenas agora a tua pergunta relativamente à questão económica da dieta vegetariana. Deixa-me primeiro que tudo separar duas questões economicamente falando: Prisma individual ou egoísta e o Prisma
a escala global.
O prisma à escala global o Pedro de uma forma simplista já te respondeu e visto duma perspectiva europeia apenas. Se alargarmos o conceito ao veganismo, então nota-se (talvez) ainda mais a complexidade económica subjacente, vide o "dumping" dos lacticínios no terceiro mundo, que novamente volta para a questão hipócrita da pseudo lei económica da escassez vs oferta e procura que é imensamente regulada para proteger os lobbies, esses sim "económicos". O valor intrinseco para a qualidade de vida, complementando com o valor da mão-de-obra directa e indirecta necessária para repor os contra-efeitos do consumo da carne a nível mundial é imensamente mais elevado do que qq consumo vegetariano ou vegano, seja de que perpectiva for e fazendo as contas como quiseres, parece-me óbvio seja duma perspectiva simplista ou complexa, vejamos apenas o quanto consome um quilo de animal em água, cereais, terreno, metano, etc.
A questão individual essa já requer uma mudança de mentalidade quanto aos valores dos alimentos. Eu cresci a pensar que a carne é que puxa carroça, e hoje ainda apanho pessoas que quando digo que sou vegetariano ou vegano não fazem ideia do que eu como ou nao como. E todos os não instruídos na matérias, mesmo alguns que o são, pensam que tenho deficiências alimentares e dizem: ah tu és daqueles que comem aqueles tofus e os satans e essas coisas né? Ora eu raramente (excepto quando estou em casa dos meus pais) como alimentos processados e caramba como eu gasto pouquíssimo dinheiro em comida, no entanto recebo tambem muitos comentários de pessoas de que nao sao vegetarianas porque é muito caro. O leite é mais barato do que as bebidas de soja, arroz, aveia, etc apenas no supermercado e isso é porque os meus impostos servem para comparticipar a sua produção, senão não era. A bebida de amendoa e de aveia que eu faço em casa fica-me muito mais barata. Enquanto os meus amigos comem bifanas eu como beringela, e para mim fica mais barato. Arroz com feijão é uma excelente refeição e muito mais barata. Mas também aqui a questão do valor intrínseco se põe, pois são os meus impostos que andam a pagar os tratamentos dos cancros e outras enfermidades que derivaram de uma má nutrição. Mesmo com os preços assim como são com todos estes lobbies seja à escala global ou à escala individual, à falta de dinheiro a escolha lógica duma perpectiva puramente financeira é a dieta vegana.
(Por: Vitor Hugo)
Re: economicamente falando...
em Abril vai haver um webinário que provavelmente te vai interessar: https://earthscanevents.webex.com/mw0306lc/mywebex/default.do?nomenu=true&siteurl=earthscanevents&service=6&main_url=https%3A%2F%2Fearthscanevents.webex.com%2Fec0605lc%2Feventcenter%2Fevent%2FeventAction.do%3FtheAction%3Ddetail%26confViewID%3D646136505%26siteurl%3Dearthscanevents%26%26%26
[Por: @ 2011-02-25, 05:01 | Responder | Imprimir ]> Maria,
>
> Vi apenas agora a tua pergunta relativamente à questão económica da dieta
> vegetariana. Deixa-me primeiro que tudo separar duas questões
> economicamente falando: Prisma individual ou egoísta e o Prisma
> a escala global.
> O prisma à escala global o Pedro de uma forma simplista já te respondeu e
> visto duma perspectiva europeia apenas. Se alargarmos o conceito ao
> veganismo, então nota-se (talvez) ainda mais a complexidade económica
> subjacente, vide o "dumping" dos lacticínios no terceiro mundo, que
> novamente volta para a questão hipócrita da pseudo lei económica da
> escassez vs oferta e procura que é imensamente regulada para proteger os
> lobbies, esses sim "económicos". O valor intrinseco para a qualidade de
> vida, complementando com o valor da mão-de-obra directa e indirecta
> necessária para repor os contra-efeitos do consumo da carne a nível mundial
> é imensamente mais elevado do que qq consumo vegetariano ou vegano, seja de
> que perpectiva for e fazendo as contas como quiseres, parece-me óbvio seja
> duma perspectiva simplista ou complexa, vejamos apenas o quanto consome um
> quilo de animal em água, cereais, terreno, metano, etc.
> A questão individual essa já requer uma mudança de mentalidade quanto aos
> valores dos alimentos. Eu cresci a pensar que a carne é que puxa carroça, e
> hoje ainda apanho pessoas que quando digo que sou vegetariano ou vegano não
> fazem ideia do que eu como ou nao como. E todos os não instruídos na
> matérias, mesmo alguns que o são, pensam que tenho deficiências alimentares
> e dizem: ah tu és daqueles que comem aqueles tofus e os satans e essas
> coisas né? Ora eu raramente (excepto quando estou em casa dos meus pais)
> como alimentos processados e caramba como eu gasto pouquíssimo dinheiro em
> comida, no entanto recebo tambem muitos comentários de pessoas de que nao
> sao vegetarianas porque é muito caro. O leite é mais barato do que as
> bebidas de soja, arroz, aveia, etc apenas no supermercado e isso é porque
> os meus impostos servem para comparticipar a sua produção, senão não era. A
> bebida de amendoa e de aveia que eu faço em casa fica-me muito mais barata.
> Enquanto os meus amigos comem bifanas eu como beringela, e para mim fica
> mais barato. Arroz com feijão é uma excelente refeição e muito mais barata.
> Mas também aqui a questão do valor intrínseco se põe, pois são os meus
> impostos que andam a pagar os tratamentos dos cancros e outras enfermidades
> que derivaram de uma má nutrição. Mesmo com os preços assim como são com
> todos estes lobbies seja à escala global ou à escala individual, à falta de
> dinheiro a escolha lógica duma perpectiva puramente financeira é a dieta
> vegana.
> (Por: Vitor Hugo)
(Por: Vitor Hugo)