Compostagem e Lamas
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Compostagem e Lamas

A reutilização dos resíduos orgânicos urbanos na agricultura, como adubo natural, tem sido prática corrente, desde sempre. Obedecia à ideia lógica de que restituir ao solo aquilo que dele se tinha obtido só poderia beneficiar as colheitas seguintes. A prática mostrava que um terreno tratado com estrume de mistura produzia mais do que um terreno não tratado.

Com o advento da era industrial e o progresso da ciência da agricultura, produziram-se os adubos químicos usados em grandes quantidades. No entanto, verifica-se que em alguns frutos o uso dos químicos altera o gosto e o aroma de uma forma muito negativa, chegando em certos casos a anular essas sensações. Estes conhecimentos práticos da experiência agrícola conduziam os agricultores a guardarem o estrume do gado em montes, que mais tarde seria utilizado como adubo. Ainda hoje é prática corrente em pequenas explorações agrícolas de manutenção artesanal.

Com o desenvolvimento urbano, a quantidade de lixo produzida por habitante (em média meio a um quilo e meio por dia) tem aumentado de uma forma descontrolada, levando ao desenvolvimento de vários problemas ambientais. Desde logo, problemas como o volume a manusear, os cheiros e o perigo para o ambiente e saúde das populações. Como uma ideia natural nasceu a hipótese do aproveitamento dos lixos na agricultura, e daí a construção de estações de tratamento de resíduos sólidos urbanos, dedicando-se à compostagem.

O processo de compostagem permite obter matéria orgânica de qualidade e, enquanto processo biológico, aproveita o facto dos lixos domésticos serem ricos em carbono, azoto e microrganismos que provocam o desenvolvimento de uma intensa e natural actividade biológica, transformando-os em compostos orgânicos úteis para a agricultura. Para dar uma ideia dos volumes manuseados temos, por exemplo, a Estação de Riba de Ave que tratou 393 mil toneladas de resíduos em 1998 que, caso não lhes tivessem dado destino, daria para encher um campo de futebol (120x60 metros) até uma altura de 61 metros.

Os resíduos urbanos são depositados num fosso de recepção (após a recolha em camiões), com uma capacidade de dois mil metros cúbicos (720 toneladas). Por uma ponte rolante, com garfo de apanha, os resíduos são levados para as tremonhas de carga dos dois cilindros de compostagem, onde é efectuada a dilaceração dos lixos, por pré-fermentação com controlo da corrente de oxigénio e humidade. A rotação dos cilindros provoca a dilaceração dos resíduos mais frágeis, enquanto se opera uma acção biológica pela permanente passagem de um caudal de ar de 7000 m3/hora.

O processo de compostagem demora três dias com temperaturas a rondar os 65 a 75ºC, destruindo os germes patológicos e parasitas. Como há resíduos sólidos que não são modificados, a mistura é encaminhada para a afinação, onde se procede à separação da matéria orgânica (compostos) dos materiais não compostáveis. Em cada tonelada tratada, cerca de 40% resulta em composto, dando 96 ton./dia ou 3 000 ton./ano. Os resíduos do processo (refugo) são prensados, enfardados e depois depositados em aterro municipal.

Finalmente, o composto é depositado num parque de maturação, por um período que vai de 15 dias a 3 meses, consoante a sua utilização, sendo permanentemente revolvido para permitir a fermentação aeróbia. Como se trata de um processo baseado na fermentação de matéria orgânica, este é acompanhado de uma grande libertação de gases poluentes para a atmosfera. À opinião negativa das populações, juntou-se o mau-cheiro que caracteriza o local das instalações. Manifestações populares ou promovidas por forças partidárias multiplicaram-se, mas o problema tinha resolução à vista. A obra para a instalação do sistema de eliminação dos maus cheiros foi efectuada e o problema foi resolvido.

No processo em exploração são seguidas as directivas comunitárias que regulamentam esta actividade, pelo que o produto final é considerado “Composto Ecológico” e está sujeito à supervisão da D. R. Agricultura. O composto funciona na formação de húmus, na prevenção da erosão, e contribui para a manutenção das características físicas do solo. É especialmente recomendado para a cultura de cogumelos, a viticultura, arboricultura, horticultura, viveiros e para a criação de prados permanentes e de culturas especiais.

Na compostagem de resíduos orgânicos, pode-se obter energia eléctrica pelo aproveitamento dos gases da fermentação (bio-gás), o que representa mais uma vantagem do processo. Os compostos são considerados como correctores orgânicos e ecológicos, amigos do ambiente. São dotados de apreciáveis quantidades de azoto, fósforo, potássio, cálcio, magnésio, sódio e boro, e possuem também baixos níveis de metais pesados.

O grande impulso na compostagem foi inicialmente dado pela Real Companhia Vinícola, que encontrou neste processo de tratamento dos solos a resposta para maximizar a qualidade dos vinhos. O Douro é uma das regiões mais pobres em matéria orgânica - um elemento fundamental para os solos de produção. Com o emprego dos compostos derivados do lixo, consegue-se melhorar a eficácia dos adubos químicos, a capacidade de retenção da água e assim melhorar a qualidade das uvas e dos vinhos.


Lamas


Como subproduto das Estações de Tratamento das Águas Residuais (ETAR’s), as lamas podem ser úteis para a correcção dos solos, desde que sejam produtos devidamente controlados. Anualmente são recolhidas centenas de milhar de toneladas de lamas no tratamento dos esgotos, das quais grande parte não se conhece o destino.

Segundo o Instituto dos Resíduos, em 1999 foram produzidas 280 mil toneladas de lamas, mas esta quantidade não corresponde “nem pouco mais ou menos“ à realidade. Em relação ao destino das lamas sabe-se que algumas são parqueadas provisoriamente, enquanto não há infra-estruturas de eliminação. Outras são depositadas nalguns aterros, se não forem perigosas, e em grande parte são valorizadas na agricultura.

A aplicação das lamas na agricultura está regulamentada desde 1991. A maior parte das ETAR’s não declaram a sua produção nem o destino que lhes foi dado. A compostagem é uma das soluções que está equacionada pela União Europeia no âmbito da revisão da directiva relativa às lamas. As soluções em discussão contemplam também a incineração, considerando que o depósito em aterro de lamas em bruto é um processo desadequado, devido aos elevados teores de humidade e dos problemas ambientais (gases e odores).

A utilização das lamas na agricultura tem riscos porque estas podem conter microrganismos patogénicos e metais pesados, embora as concentrações não sejam geralmente preocupantes. Os especialistas preferem investir na prevenção, evitando ou reduzindo a chegada de compostos nocivos às águas residuais, que dão origem às lamas. Por exemplo, os champôs podem ser responsabilizados por boa parte das concentrações de zinco que são descarregadas nos esgotos. Os desinfectantes domésticos estão igualmente carregados de aditivos.

Prevenir significa evitar consumir estes produtos e ainda compostar as lamas, em vez de as aplicar só com o tratamento final de secagem e moagem. As lamas não são substitutos dos adubos, mas tão só fertilizantes orgânicos e correctivos, restituindo ao solo o que lhe é retirado pela agricultura e chuvas. Falamos de nutrientes de que a terra necessita, sobretudo azoto, fósforo e cálcio. Será um processo de melhoria dos solos em termos agronómicos.

As lamas compostadas, processadas com outro material de origem orgânica (serradura ou palha, por exemplo) com a degradação aeróbia (actividade microbiana em meio rico em oxigénio), e processadas a temperaturas de 50 a 60ºC (para eliminação de organismos patogénicos), durante três a quatro dias, apresentam garantias de perfeita higienização.

As lamas cruas, se aplicadas no solo, acabam por compostar naturalmente, mas além do calor desenvolvido poderão libertar compostos que sejam tóxicos para as plantas. Com as lamas as culturas crescem mais rapidamente e aumenta a produção. As espigas e maçarocas do milho são mais cheias. O aumento da produtividade é significativo. Num solo sem lamas poderá obter-se 14 toneladas de milho por hectare; com o emprego das lamas compostadas podem-se obter 16,5 ton./hectare.

Embora o milho seja a cultura em que mais se aplicam lamas (80% da produção), outras têm ainda uma melhor resposta. A aplicação deste correctivo orgânico exige o conhecimento das características do solo, porque, por exemplo, um excesso de azoto pode conduzir à mineralização e transformação em nitratos, poluindo o solo. A função da matéria orgânica é reter e rentabilizar estes alimentos vitais no solo, além de devolver nutrientes que a agricultura intensiva retira em grande parte.


Perigo ambiental


É relatado e reconhecido que os aterros de resíduos orgânicos são um perigo ambiental dito menor do que deixar os resíduos ao acaso. A Quercus recomenda que os resíduos orgânicos sejam tratados à parte dos outros resíduos urbanos para minimizar os riscos. Diz que: “face aos grandes riscos ambientais do aterro, a matéria orgânica, que representa cerca de metade do total de resíduos, deve ser tratada numa estação de compostagem, como processo natural de decomposição de resíduos orgânicos.” O processo de compostagem permitiria, de acordo com os ambientalistas, diminuir em cerca de 60% o volume dos resíduos colocados no aterro, reduzir o problema da poluição das águas e dos maus cheiros e recuperar materiais para reciclagem.



Copyright Centro Vegetariano. Reprodução permitida desde que indicando o endereço: http://www.centrovegetariano.org/Article-234-Compostagem-e-Lamas.html

Inserido em: 2003-09-28 Última actualização: 1999-11-29

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