Diz-se comummente, no ramo da filosofia, que Platão é o filósofo dos céus e Aristóteles o filósofo da terra. Porquê? Porque a filosofia de ambos preconiza princípios opostos de abordagem do conhecimento. Um parte do particular para o geral (realidade sensível - ideia), o outro parte do geral para o particular (forma - objecto). De facto, é Aristóteles, discípulo de Platão, que sistematiza, pela primeira vez na história da filosofia, uma lógica do conhecimento, bem como o processo de apreensão do objecto pelo sujeito, elaborando então as diferentes etapas desse mesmo processo. Assim, primeiro, o sujeito inicia o processo de conhecimento pela observação. Logo nesta primeira etapa Aristóteles afasta-se do seu mestre, que se preocupava antes em descobrir o mundo das ideias, abstraindo-se assim de toda a realidade sensível.
Com efeito, Aristóteles admite que o conhecimento parte das sensações, embora estas sejam muitas vezes enganadoras e ilusórias. Daí que seja preciso algo que fundamente e sustente as afirmações acerca do real. Esse algo é o princípio de universalidade que só a Razão (Logos) pode conferir à argumentação.
O Logos é, então, não só um discurso eidético (que diz respeito à ideia), mas também um discurso argumentativo por excelência acerca do real e das coisas sensíveis. Uma opinião pode ser uma opinião correcta (doxa). O erro e a falsidade podem ser transmitidos na argumentação e podem ser tanto evidentes (absurdos ou impossíveis), como não-evidentes e tomados como válidos (falácias). O poder argumentativo torna-se assim uma "faca de dois gumes", pois adquire um valor duplo: por um lado, traz o aumento do saber, por outro lado, produz a contaminação do erro. Daí a importância da ética e do comportamento humano.
A educação tem um estatuto tão importante em Aristóteles como em Platão. Só que em Platão a educação destinava-se à sensibilização do filósofo para as ideias. Em Aristóteles, ela confere ao homem o poder de decifrar, interpretar e "driblar" a linguagem, de forma a perceber-lhe os erros propositados ou não, para que possa agir em conformidade com a ideia. O discurso assume o carácter de "verdade como adequação" e verificar se aquele é ou não adequado com a ideia é o que está destinado ao filósofo fazer. Como saber se determinada proposição é verdadeira ou não? Como saber se um juízo é válido? Para Aristóteles, estas são questões importantes para formar um conhecimento verdadeiro acerca das coisas. As coisas estão aí aos nossos olhos, mas há que julgá-las em conformidade, em todas as suas dimensões. Não basta especular; é preciso provar, comprovar, verificar. E estabelecer uma adequação da descrição da coisa mesma ao discurso.
Aristóteles escreveu obras de filosofia nas mais diversas áreas e matérias. Os seus escritos compõem-se de escritos lógicos, escritos sobre a física, metafísica, escritos morais e políticos e ainda escritos sobre a retórica e a poética. Entre eles encontram-se afirmações de carácter dúbio quanto ao papel dos animais, mas tudo leva a crer que Aristóteles prezava a vida destes, visto serem úteis aos humanos. Segundo nos faz crer um comentador ligado ao movimento vegetariano, Colin Spencer, os animais seriam comparados a escravos e, por isso, tinham alma. Aristóteles simpatizava igualmente com a visão órfica partilhada pelos gregos. Assim, pode ser que este filósofo fosse também vegetariano ou, pelo menos, adoptasse um regime alimentar estrito.
Esta postura seria, aliás, coerente com a posição ética quanto ao que se refere de bem comum, em detrimento de um bem particular. O facto de não agredir os animais, nem de os matar para comer, poderia ser uma postura adoptada para poder viver bem com eles, partilhando princípios com o resto da comunidade. Para tudo há uma regra. Para tudo há uma causa. Logo, o vegetarianismo pode ser uma acção determinada por várias causas...
Aristóteles nasceu em Estagira por volta de 384 a.C. e morreu em 322 a.C, exilado em Eubéia, por ter sido acusado de ateísmo. Foi discípulo de Platão e mestre de Alexandre Magno, o Grande.
Citações:
"Os métodos de persuadir alguém por meio das palavras compõem-se de três modos: o primeiro modo depende do carácter pessoal de quem as diz; o segundo de captar a atenção da audiência e o terceiro constitui-se pela prova, que advém da argumentação do próprio discurso."
Aristóteles, Retórica
"As virtudes morais produzem-se, pois, em nós, mas não estão nem na natureza nem existem contra a natureza. Na realidade, a natureza prepara-nos para a sua aprendizagem, mas a sua formação completa dá-se através da criação de hábitos."
Idem, Ética a Nicómaco
"Foi por terem a capacidade de se espantar que os homens começaram desde sempre e em primeiro lugar a filosofar... E o homem sente-se confuso e ignorante; logo, uma vez que ele começou a filosofar para escapar à ignorância, é evidente que começou a investigar a ciência tendo em vista o conhecimento e não por querer realizar um fim utilitarista."
Idem, Metafísica
"O legislador deveria dirigir a sua atenção para a educação da juventude, acima de tudo; pois a negligência da educação prejudica a constituição. Os cidadãos devem ser orientados para servirem o governo sob o qual são regidos. Pois cada governo tem a característica peculiar de cuja origem se formar e com a qual se irá continuar a preservar. A característica de democracia cria a democracia e a característica de oligarquia cria uma oligarquia."
Idem, Política
"Assim, a virtude é a característica daqueles que agem em função da escolha do justo meio, definido como o que está mais de acordo com a razão. É o justo meio, que se encontra entre os dois tipos de vícios, um por excesso e o outro por defeito, que é, pois, a atitude mais correcta, quer nas paixões, quer nas acções, porque os vícios aumentam ou diminuem de intensidade, (respectivamente, quer sejam por excesso ou por defeito), enquanto que a virtude, tanto encontra, como escolhe aquilo que é intermediário."
Idem, Ética a Nicómaco