Há uma ligação inquestionável entre o vegetarianismo e a cultura indiana. O conceito de não-violência (ahimsa, em sânscrito) foi um dos grandes motores por detrás da difusão do vegetarianismo pela religião, cultura, e culinária indiana.
O imperador Ashoka (século III AEC), depois de se converter ao budismo, foi um dos principais líderes políticos na Índia a promover o vegetarianismo e alguma legislação relacionada com os direitos dos animais. Não é claro, no entanto, se o próprio Buda (seja enquanto figura histórica ou lendária) terá sido estritamente vegetariano. Esta questão é debatida entre as diferentes tradições budistas.
Ao contrário do que se possa pensar, o vegetarianismo não é uma tendência recente no nosso país, pois tem já, pelo menos, um século de história. A primeira referência, atualmente conhecida, à divulgação do vegetarianismo em Portugal, remonta ao início do século XX (provavelmente 1908), com a criação da Sociedade Vegetariana de Portugal, fundada na cidade do Porto, pelo Dr. Amílcar de Sousa, e situada na Avenida Rodrigues de Freitas.
António Cardoso, nascido a 2 de Dezembro de 1929, é vegetariano há mais de 60 anos e é sócio da SPN - Sociedade Portuguesa de Naturalogia - desde os 17 anos. Ao longo destes anos, tem dedicado muito da sua vida e tempo à SPN, à divulgação das suas actividades (participante em quase todas, especialmente nos Passeios Pedestres). É há muitos anos o responsável pela organização das Conferências quinzenais onde podemos ter o privilégio de ouvir oradores interessantes debatendo temas igualmente interessantes, relacionados com o Vegetarianismo, o Naturismo e não só: os temas das conferências são, de facto, alargados a todas as tradições e ideologias ou práticas que visem a saúde e o bem estar geral do ser humano. Ao longo de todos estes anos de dedicação, ocupou igualmente cargos na Direcção, foi Presidente da Mesa da Assembleia Geral até há cerca de um ano, a partir de então tendo assumido o cargo de Vice-Presidente da actual Direcção.
O Centro Vegetariano foi ao seu encontro para conhecer um pouco da história da SPN e do vegetarianismo em Portugal.
Quando começaram os nossos antepassados a comer carne?
Quando se iniciou o consumo de carne? Podemos datar a caça a partir de ferramentas usadas para matar, mas antes delas já existiam algumas muito básicas para cortar, raspar e cavar que foram encontradas junto dos restos mortais do Homo Habilis, que viveu há cerca de 1 milhão e meio a 2 milhões de anos atrás. Os antropólogos consideram provável que o Homo Habilis obtivesse a sua carne através da caça a felinos, mas tal como muito do que se diz acerca da evolução dos humanos, é apenas especulação.
Há cerca de 60 milhões de anos desenvolveram‑se os primeiros primatas*, mamíferos dos quais todos descendemos, e com eles partilhamos muitas das capacidades que hoje possuímos. A evolução da garra para a mão foi muito importante do ponto de vista da capacidade de utilização de objectos como ferramentas (nomeadamente pedras e paus), ao mesmo tempo que a localização dos olhos nas zonas laterais do rosto ia sendo gradualmente substituída pela zona frontal, o que possibilitou que a nossa visão se tornasse estereoscópica, ou seja, que passássemos a ver em relevo as imagens planas. A sobreposição dos campos visuais daí resultante deu origem à visão em profundidade, vital para a identificação de predadores à distância.
Na ceia de Natal dita a tradição portuguesa que se coma o bacalhau. Mas, a origem do consumo deste peixe remonta aos vikings, considerados os pioneiros na descoberta do bacalhau, pois a espécie era abundante nos mares que navegavam. A falta de sal na época fazia com que se limitassem a secar este peixe ao ar livre, até endurecer, para depois ser consumido aos pedaços nas longas viagens que faziam pelos oceanos.
Antes de 1944 não se fazia distinção entre vegetarianos e veganos. A palavra "vegetariano" englobava os dois conceitos. Foi usada formalmente, pela primeira vez, no dia 30 de Setembro de 1847, por Joseph Brotherton e outros, em Northwood Villa, Inglaterra, por ocasião da reunião inaugural da Sociedade Vegetariana do Reino Unido. Até 1847 os que não comiam carne eram conhecidos como "pitagóricos", ou seguidores do "sistema pitagórico", por causa do filósofo Pitágoras, da Grécia Antiga, também vegetariano.
Na Pré-História
O vegetarianismo surgiu há cerca de 5 milhões de anos atrás. O nosso antepassado mais antigo, o Australopithecus Anamensis, alimentava-se de frutas, folhas e sementes, vivendo em perfeita harmonia com os animais mais pequenos, que poderia facilmente apanhar para se alimentar. Mas a índole destes hominídeos era pacífica e assim continuou até ao Australopithecus Boesei (existiu há cerca de 2,4 - 1 milhão de anos).
No campo dos filósofos helenísticos, ou se quisermos pré-aristotélicos, que preconizam a prática de vegetarianismo ou, pelo menos, um regime restrito à base de frutas ou vegetais, existe uma corrente dos que se opõem aos já mencionados, em artigos anteriores, de epicuristas, ou filósofos do prazer. Esta corrente denomina-se o Estoicismo, que defende, entre outras coisas, que os dogmas não devem ser considerados como verdades absolutas.
Apesar de não ser considerado vegetariano, Epicuro (nascido a 341 a.C. em Samos) fundou a Escola Epicurista, denominada O Jardim, que adoptou posições de defesa em relação ao vegetarianismo combatendo arduamente a tendência de outros em considerarem a sua filosofia como a filosofia dos excessos e do prazer. O próprio Epicuro se debateu contra esta ideia, dizendo que nada na sua filosofia defendia tais alardes. Pelo contrário, o que Epicuro preconizava era a crença de que se um indivíduo satisfizesse as suas necessidades mais básicas, os seus desejos manter-se-iam equilibrados, não tendo, por isso, qualquer necessidade extravagante ou que o conduzisse a excessos desnecessários. Ou seja, satisfazendo os desejos mais naturais, quer em relação à alma, quer em relação ao corpo, desde que fossem necessários, isto é, como constitutivos à própria natureza humana.
Diz-se comummente, no ramo da filosofia, que Platão é o filósofo dos céus e Aristóteles o filósofo da terra. Porquê? Porque a filosofia de ambos preconiza princípios opostos de abordagem do conhecimento. Um parte do particular para o geral (realidade sensível - ideia), o outro parte do geral para o particular (forma - objecto). De facto, é Aristóteles, discípulo de Platão, que sistematiza, pela primeira vez na história da filosofia, uma lógica do conhecimento, bem como o processo de apreensão do objecto pelo sujeito, elaborando então as diferentes etapas desse mesmo processo. Assim, primeiro, o sujeito inicia o processo de conhecimento pela observação. Logo nesta primeira etapa Aristóteles afasta-se do seu mestre, que se preocupava antes em descobrir o mundo das ideias, abstraindo-se assim de toda a realidade sensível.
A época que se segue após as grandes correntes clássicas da filosofia (platonismo, por um lado, e aristotelismo, por outro) vem gerar grandes tumultos para o desenvolvimento do pensamento pré-medieval. Entre todas as correntes de pensamento nessa época destacam-se, nomeadamente, o neo-platonismo, que tentará resolver a problemática do dualismo corpo/alma, que permanece uma questão insolúvel após o fim do pensamento clássico grego.
Platão nasceu no seio de uma família bem posicionada na sociedade ateniense tradicional em 428 a.C. O seu destino era, primeiramente, ir para a política, a cuja actividade a sua família se dedicava por afinidade. Porém, a guerra do Peloponeso, que se iniciara entre os gregos e os espartanos, no ano de 431 a.C, e durara ainda algum tempo, alterou o curso da sua vida, fazendo-o orientar mais para os problemas ligados à política do que propriamente para ela mesma. A filosofia será, assim, uma actividade para a qual ele inclinará toda a sua ideia do que é, ou deve ser, a política, a organização social, a justiça, o bem, etc., por influência dos discursos de Sócrates que, nessa época, já faziam furor na praça principal de Atenas.
À semelhança do que acontece com Pitágoras, nenhumas certezas se podem ter acerca dos hábitos alimentares de Sócrates. A única certeza é o facto de que se especula muita coisa acerca do seu ambiente e o mais provável é que parte do que a história nos revela sobre a vida dele permaneça inexacta. De quase todos os filósofos gregos que elaboraram teorias inovadoras, Sócrates foi o que mais pôs em causa a ordem vigente, estabelecida pelo poder político.
Supostamente, Pitágoras foi um filósofo matemático do séc.VI a.C (570-571) e terá sido o filósofo que mais marcou esta era, em termos de racionalidade. A defesa do vegetarianismo não passa, no fundo, de um princípio provável da teoria por ele fundada, ou seja, o Pitagorismo. A teoria apontada como Pitagorismo é, na realidade, uma teoria muito importante para a história da matemática. Mas sobre Pitágoras pouco ou nada se sabe, pois tanto a sua vida como a sua morte foram um mistério e alguns historiadores apontam até para a hipótese de ele nunca ter existido. Exilado durante a maior parte da sua vida, o pensador praticou, numa primeira fase, os rituais órficos da religião que se implantou na Grécia, mas fundou posteriormente o pitagorismo, corrente que viria a ser um pouco mais radical do que a primeira.